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A Orquestra do Amanhã

“Muita gente nem imagina que numa cidade do interior, a 550 km da capital, exista um projeto com esta grandiosidade social, musical e cultural” – comenta Luís Fernando Paina, instrumentista profissional, especializado em Ensino Coletivo de Música. O projeto em questão é a Corporação Musical de Fernandópolis, que trabalho com cerca de 210 crianças e adolescentes, convencidos a trocar as horas de ócio típicas à sua faixa etária pelo estudo musical. O aprendizado, porém, não é apenas técnico. “O mais importante de tudo é o resgate social que fazemos. Eles começam tendo aulas de música que aos poucos vão se tornando mais frequentes e, quando se dão conta, já estão se apropriando dos recursos que oferecemos para sua própria socialização” – complementa Paina, que há mais de 15 anos está à frente da instituição como diretor artístico e musical.

É noite de quinta-feira e a Orquestra do Amanhã tem ensaio marcado. Trata-se de uma formação que reúne cerca de 40 músicos aprendizes e tem papel intermediário entre a Orquestra do Futuro, primeira etapa coletiva do projeto, e a Osfer – Orquestra de Sopros de Fernandópolis, representante oficial da instituição. Aos poucos, adolescentes divididos em suas habituais turmas começam a tomar o espaço. Os mais novos têm entre 10 e 14 anos e aumentam o volume de suas vozes de acordo com o nível de agitação. Os mais velhos, entre 17 e 18 anos, conversam e sorriem discretamente.

Neste último grupo, está Lariane. Ela tem 18 anos e já faz parte da orquestra principal, mas vem aos ensaios da intermediária para auxiliar os companheiros mais novos. Sua família sempre teve muitos músicos e Lariane pôde exercitar sua herança artística quando conheceu Paina em outro projeto social. “Comecei aprendendo flauta doce com o Fernando na Cofasp (Comunidade das Famílias São Pedro), aí ele me chamou para vir para cá”. Há sete anos na Corporação, Lariane foi beneficiada pelo método de ensino gradativo, pelo qual crianças podem começar a frequentar as aulas de musicalização infantil e passam a integrar as orquestras de acordo com sua evolução natural. Só deixam de participar quando quiserem. O próprio Paina foi um dos alunos: “Eu comecei estudando música aqui, com o professor Manoel Marcos Filho. Depois estudei em Rio Preto, no Conservatório de Tatuí e em São Paulo, mas nunca me distanciei daqui” – conta.

O ensaio só começa após a visita do psicólogo que acompanha o grupo. Sentados lado a lado em um grande círculo, realizam o exercício do dia, que ressalta a importância de aprender a fazer escolhas. Após o término da dinâmica, todos se encaminham para a sala principal e tomam seus lugares. Quando Paina movimenta a mãos reivindicando a liderança do grupo, a mágica acontece. A postura da turma muda completamente, o murmurinho cessa e eles colocam-se atentos à regência. Dali para frente torna-se fácil perceber porque o método de ensino da Corporação já foi citado e reconhecido em grandes eventos musicais, como a Midwest Clinic em Chicago e as reuniões da Wasbe, uma associação internacional de bandas sinfônicas. A cumplicidade estabelecida entre os músicos e o maestro ultrapassa as barreiras das relações professor/aluno. Em poucos minutos, após algumas observações, correções e alfinetadas (sempre bem humoradas), todos se encontram em perfeita harmonia musical.

Quando o ensaio termina, todos os presentes se parabenizam com apertos de mãos e tapinhas nas costas. Aos poucos, guardam seus instrumentos e as conversas, risadas e brincadeiras, e vão recomeçando. Por hora, o dever está cumprido e a Orquestra do Amanhã pode voltar a ser adolescente e se comportar como tal. “Não importa se eles vão se tornar bons músicos ou não” – explica Paina – “O que a música traz para a vida dessas crianças vai fazer com que eles sejam pessoas melhores, com maior sensibilidade para lidar com certas situações da vida” – comemora, com a convicção que só tem quem já esteve no lugar deles.

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Texto, foto e vídeo: Jeff Santanielo

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