Carregando...
Texto alternativo Texto alternativo

Varpa (Tupã): a Europa no Oeste Paulista

É como um verão na Europa. Grama verde, cercas brancas, flores, árvores e um povo báltico extremamente simpático, tal qual o povo brasileiro. Isso porque estamos no interior de São Paulo, mais precisamente no distrito de Varpa, pertencente ao município de Tupã, e que é pedaço da Letônia em terras canarinhas. Talvez a única comunidade letã ainda organizada por esses lados.
Foi graças a esse distrito repleto de belezas naturais e pessoas receptivas que Tupã recebeu o título de Estância Turística do governo paulista. Por isso, é roteiro obrigatório de quem visita a cidade. O local, porém, fica ainda mais belo quando tem sua história contextualizada.

Esse quinhão europeu no sertão paulista é tão importante que é, inclusive, mais velho que a própria cidade à qual pertence administrativamente. Enquanto Tupã foi fundada em 1929, Varpa nasceu em 1922, quando após a Primeira Guerra Mundial imigrantes deixaram a Letônia rumo ao Brasil em função do cerceamento à liberdade de culto imposto pelo regime bolchevista. Eles eram unidos e, os que cá chegaram, eram predominantemente religiosos batistas.

A saga foi tamanha que, segundo registros da história local, os imigrantes desembarcavam da Europa no Porto de Santos e, depois de 22 horas viajando pela Estrada de Ferro Sorocabana, desciam na estação Sapezal, em Paraguaçu Paulista, e caminhavam 31 quilômetros pela mata até chegarem à colônia.

Primeiro vieram dois para comprar as terras e decidiram que ali, ao lado do Rio do Peixe, seria formada a comunidade. Depois vieram os outros. Eram mais de 2.400 imigrantes letos criando uma comunidade em sistema de cooperativa. Eles desbravaram a mata, construíram as casas com arquitetura europeia e eram autossuficientes. Inclusive com energia elétrica proveniente de um sistema ligado à queda d’água existente no local.

Construíram uma Igreja Batista que cabia mais de 1.000 pessoas sentadas, chegando a ser a maior da América do Sul à época. Falavam exclusivamente o leto, até que a ditadura militar instalou lá uma escola oficial e obrigou o uso da língua portuguesa.

Depois do seu auge autossuficiente, principalmente na década de 1930, a criação de Tupã e a falta de opções profissionais e educacionais levaram os descendentes a irem deixando a cidade nos anos seguintes.

“Os filhos foram saindo porque aqui tinha que trabalhar na lavoura e as escolas eram muito longe. Então, os pais mandavam os filhos para as capitais para estudar e ter uma vida melhor. E isso foi gerando uma diminuição da comunidade”, diz Lúcia Nely Zalit Bukolzf, que é a responsável pelo Museu Janis Edbergs e nasceu em Varpa, assim como seu pai. Seus avós paternos fizeram parte do grupo de desembarcou nas terras em 1922.

Dos mais de 2.400 habitantes que o distrito chegou a ter no seu apogeu, hoje estão por lá cerca de 800, grande parte deles descendentes diretos do letos que escolheram aquele pedaço de chão para viver. E estes também escolheram ficar e manter viva a cultura trazida para cá.

No distrito ainda há traços da arquitetura europeia implantadas em meados da década de 1920, ainda há culinária típica e a Corporação Evangélica Palma se tornou a Fazenda Palma, responsável pela restauração de antigos barracões de madeira, conservando seus traços originais, transformados em alojamentos. Lá tem queda d’água e uma paisagem incrível, cercada por mata fechada e opções de trilhas.

Um dos fundadores da comunidade, recolheu objetos utilizados pelos imigrantes ao longo do tempo e que formam hoje o Museu Janis Edbergs, que leva o seu nome e onde a Lúcia é monitora, sob a gestão da Prefeitura de Tupã. Ah, e ele fica aberto à visitação de terça a domingo.

A gastronomia local também é alvo de muita visitação. Em Varpa existem alguns apiários que vendem mel puro, mas os destaques mesmo são o Rancho dos Defumados e a Geleia da Dona Neuza. Só para ilustrar a qualidade dos seus produtos, ambos estão na final do Festival Gastronômico Sabores de São Paulo.

O rancho é do Valfredo Olavo Bukolts, 50 anos, que além de marido da Lúcia (lembra dela aí pra cima?) também nasceu em Varpa. Lá, ele vende especiarias como salame, joelho de porco, costelinha, filé mignon suíno e a tal linguiça mista defumada, que lhe rendeu a participação na final do festival.

Já a Geleia da Dona Neuza, outra parada obrigatória em Varpa, é tocada por ela mesma, a Neuza Pereira de Oliveira. E lá são encontradas iguarias caseiras como doce de leite puro e com diversas misturas, geleias de todos os tipos e até pimentas em conserva. E é claro, a receita que a colocou na final do festival gastronômico: compota de goiaba.

Enfim, grama verde, cercas brancas, flores, árvores e um povo báltico extremamente simpático. Varpa continua linda!

Posts relacionados

O desbravador enterrado no quintal