Ih! Lá vai mais um cachorro invadir o espaço do espetáculo.
Lá se vão os artistas invadindo a praça.
E esse povo tomando as ruas!?
Não há nada mais revolucionário do que um cão, delimitando o seu território, mostrando o seu espaço. Aquele sempre foi o local dele até chegar todo mundo e ele resistente aparece no meio do espetáculo como se dissesse “você pode usar, mas aqui também é o meu lugar, okey!?”.
Mas e esse povo e esses artistas? Eles não tem o q fazer em casa!? Tem sim. Muita coisa pra fazer em casa, pra fazer nas ruas, pra fazer na praça! A arte é revolução e é ali que o povo tem que estar. As ruas, as praças os caminhos são de todos e precisam ser ocupados.
Moro na capital de São Paulo, local onde cada vez mais se vende a ilusão do conforto das ‘áreas de lazer’ cercadas dentro dos condomínios a preços cada vez mais abusivos, e fico feliz quando vejo essas cidades do interior resistentes, com sua praça, aquele coreto no centro, a igrejinha simples mas bem decorada, as pessoas conversando, crianças brincando, famílias passeando…E é tudo de graça! Essa é a essência! As pessoas precisam se ver, olhar nos olhos. A praça é o coração da cidade e só tem função se ocupada pelos moradores. É por ali que a vida passa, pulsa e se encontra.
O espaço é democrático! O encontro do rico com o pobre assistindo juntos ao mesmo espetáculo (claro que essas diferenças não deveriam existir mas aí é assunto pra outra pauta). Ali não tem área VIP (very important people). Ou melhor, toda aquela área é VIP porque todas as pessoas (e cachorros e todos os animais) são importantes.
Por onde o Circuito Sesc de Artes passou muita coisa aconteceu. De repente a cidade pacata foi tomada por um monte de malucos, vindos de toda parte,trazendo na bagagem essa loucura do sonho que é viver de arte. Ali, aquele espaço foi o local do encontro do sonho com a realidade: ouvida, sentida, retransmitida…trocada. Tiveram os causos, teve a criança que mostrou sua arte, as palavras criadas, a arte de observar a vida passando e a saudade aflorada.
O que é seu é seu, mas o que é céu é nosso. Essa frase dita pela integrante do grupo Gomesninow no primeiro dia, ainda na saída dos ônibus para essa jornada, fica martelando na minha cabeça. As individualidades devem permanecer intactas mas o mundo precisa da arte e da praça. Que o cachorro a ‘invada’, que as pessoas saibam usá-la e que dali possam olhar para cima. Pra tudo aquilo que não se toca mas é possível de se alcançar. Que a arte continue provocando, nos fazendo pensar, permitindo que as crianças, jovens, adultos, velhos e também os cachorros, mesmo depois de um grande turbilhão de coisas, saibam que ainda é possível sonhar.
O céu é de todos!
Texto e Fotos: Ronaldo Domingues